O
movimento Viva Rio colheu assinaturas de sete ex-ministros da Justiça,
dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva,
todos favoráveis à descriminalização das drogas. São eles: Tarso Genro,
Márcio Thomaz Bastos, Nelson Jobim, José Gregori, Aloysio Nunes
Ferreira, José Carlos Dias e Miguel Reale Jr. Eles acreditam que tirar o
usuário de entorpecentes do âmbito penal, como fizeram outros países,
trará uma política mais efetiva de combate ao narcotráfico e ao
tratamento da dependência.
Na semana passada, a carta foi entregue
ao Supremo Tribunal Federal (STF), que já estava com o debate em relação
à maconha na pauta deste semestre. Com o posicionamento de juristas
desse porte, plantou-se novamente a polêmica.
Os ex-ministros argumentam que a
política de repressão não reduziu os índices de violência ou a
quantidade de usuários. Para eles, é preciso mudar o eixo da questão,
tratando o usuário, não do ponto de vista da segurança, mas da saúde
pública. Usando de exemplo países como Portugal, eles creem que a prisão
de infratores foi substituída por oferta de tratamento médico. Assim,
os investimentos e esforços policiais focariam apenas no combate aos
traficantes. Mais do que isso, eles afirmam que não se pode tolher o
direito individual. Da mesma forma que beber ou fumar são escolhas
pessoais, a despeito dos malefícios à saúde ou à sociedade, injetar
heroína ou cheirar cocaína também são. A rigor, defende o atual
governador Tarso Genro (RS), quem consome droga na intimidade de seu lar
não faz mal a ninguém.
No
Brasil, a discussão ainda é polêmica. Nossa legislação não tipifica
quantidades de drogas para classificar alguém como usuário ou
traficante. Fica a critério do policial que fez a abordagem e do juiz,
de acordo com os antecedentes do detido e as circunstâncias do
flagrante. Se uma pessoa é pega com “pequena quantidade” não pode ser
presa, mas terá sua ficha criminal suja. “Na prática, o que acontece: o
pobre é tido como traficante e segue para a cadeia; a classe média e
alta, como usuária”, diz Paulo Gadelha, presidente da Fiocruz e da
Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia, que encabeça a campanha
“Lei de Drogas: É Preciso Mudar”. O movimento reclama que essa
indefinição técnica transformou milhares de usuários em presidiários.
Uma lógica que abarrota ainda mais o sistema penitenciário do país.
Dados recentes dão conta de que um terço da população carcerária está
presa por tráfico de drogas.
Do
outro lado, os críticos dos ex-ministros rebatem que o direito
individual não pode estar acima do direito coletivo. O uso de
entorpecentes está ligado a diversos episódios de violência e dramas
familiares. Transtornos mentais decorrentes do uso de drogas são a
segunda causa de internações em hospitais públicos psiquiátricos. A
aposta é de que a descriminalização facilitaria o acesso às substâncias
ilícitas, uma vez que 75% da população já experimentou bebida alcoólica,
enquanto apenas 9% fumou maconha, segundo a Secretaria Nacional de
Políticas sobre Drogas (Senad). Além disso, afirma o médico Ronaldo
Laranjeiras, da Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas da Universidade
Federal de São Paulo, suprimir o status de crime levaria aos mais jovens
a ideia de que consumir drogas não é arriscado ou perigoso.
A
reforma desejada pelos projetos de lei em tramitação no Congresso,
inclusive, assume seu caráter contraditório, pois permite o uso das
drogas, mas proíbe a venda. Como liberar a demanda restringindo a
oferta? Parece ingênuo, sob essa ótica, acreditar que a medida
liquidaria com a produção e a distribuição das drogas – também
relacionadas ao tráfico de armas e à corrupção policial. “Esses
ex-ministros se omitiram criminosamente quando ocuparam o cargo e não
investiram em programas e tratamentos para dependentes”, diz
Laranjeiras. Para o médico, não é preciso abdicar do controle penal
sobre o usuário para aprimorar a rede de saúde e prevenção ou endurecer
contra o tráfico. Pronto para ser votado pelo plenário da Câmara, o
projeto do deputado Osmar Terra (PMDB-RS) defende aumentar a pena para
traficantes, a possibilidade de internação involuntária de usuários a
pedido da família e a isenção fiscal às empresas que empregarem
dependentes químicos em recuperação.
Outro ponto contra a opinião dos
ex-ministros e entidades: replicar modelos que funcionaram em outros
países não significa vislumbrar um futuro bem-sucedido por aqui. O juiz
Luís Gustavo Barbosa de Oliveira, da 3ª vara de entorpecentes do
Distrito Federal, vai mais longe e se baseia em estatísticas para
discordar dos ex-ministros. Diz que apenas 5% da população é usuária de
drogas, segundo a Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas; e 76%
dos brasileiros apoiam a proibição ao consumo, de acordo com uma
pesquisa do Datafolha. “Governo e entidades têm se mobilizado para
assegurar a prevalência do interesse de uma inexpressiva minoria em
detrimento do bem-estar da grande maioria”, afirma Oliveira.
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Fonte: Isto é
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