A troca dos prontuários hospitalares de papel para os arquivos digitais vai mudar mais do que o suporte no qual estão anotadas as informações dos pacientes.
Ferramentas desenvolvidas para analisar os dados contidos nesses arquivos podem ajudar os médicos a controlar a prescrição de remédios, a equacionar filas de pacientes para procedimentos em hospitais públicos e até a saber qual dos internados pode tem maior risco de piorar nas horas seguintes.
O Hospital Santa Catarina de Blumenau (SC) vai começar a testar, a partir de fevereiro de 2013, um algoritmo usado em nove hospitais americanos para prever o prognóstico do paciente, saber quais têm mais chance de voltar a ser internados caso recebam alta e quais devem ser priorizados nas rondas dos médicos e enfermeiros.
Indicadores
De acordo com o cardiologista Luiz Haertel, diretor médico de um programa de prontuários eletrônicos usado no hospital, o algoritmo leva em conta resultados de exames como pressão, frequência cardíaca, hemogramas e testes de função renal, além de observações da enfermagem, como a aceitação do paciente à comida e o seu risco de queda.
“O algoritmo dá um peso a cada uma dessas variáveis. Se uma piorou, a curva vai começar a cair, ainda que o paciente não sinta nada”.
A ferramenta, chamada de Índice Rothman, vai ser avaliada por um ano no hospital de Blumenau. O objetivo é saber se vai haver mudança na conduta dos médicos e se o atendimento vai melhorar.
“A junção de informações que estão separadas no prontuário pode virar um novo conhecimento e dar pistas de diagnóstico e tratamento”.
Domínio do papel
O alcance da digitalização ainda é baixo no Brasil. Segundo Marco Antonio Gutierrez, presidente da Sbis (Sociedade Brasileira de Informática em Saúde), menos de 10% dos hospitais no país têm algum tipo de prontuário eletrônico, somando cerca de 600 instituições.
Na atenção básica, como em postos de saúde e ambulatórios, os sistemas se limitam a controlar agendamento de consultas. O paciente só vai ter seus dados registrados em um prontuário se chegar a um dos hospitais que já aderiram ao sistema.
O Incor (Instituto do Coração do HC de São Paulo) é um deles. O instituto tem um departamento de informática, dirigido por Gutierrez, que desenvolveu o programa usado ali há cerca de dez anos.
“O sistema nunca termina. Estamos aumentando o número de ferramentas de apoio ao diagnóstico, saindo de uma fase de registro de dados e entrando num sistema mais ativo”, diz o engenheiro.
A fila de cirurgia, por exemplo, é formada de acordo com um indicador de risco gerado pelo prontuário eletrônico, usando dados como idade, sexo e resultados de exames. “É um método objetivo”.
O sistema também gera alertas caso o médico receite remédios que possam ter uma interação perigosa.
Economia
O Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira (Icesp) também tem um sistema de prontuário, que tem sido útil, entre outras coisas, para acelerar a fila de cirurgias.
Kaio Jia Bin, diretor de operações e tecnologia de informação do instituto, afirma que hoje, se um paciente desmarcar sua operação por qualquer motivo, é possível aproveitar a mesma equipe de cirurgia para outro doente, evitando que equipamentos e profissionais fiquem ociosos – isso se a desistência for avisada em um prazo de 24 horas.
“Consigo substituir o paciente em 94% dos casos. Só com essa gestão, economizamos R$ 3 milhões entre 2010 e setembro de 2012 e agilizamos a fila”.
Mas o médico faz ressalvas ao uso de cálculos matemáticos para estabelecer quais doentes devem ter prioridade. ”Quanto mais automatizado é o atendimento, menos médicos você vai ter. Um algoritmo pode baratear o custo e piorar o atendimento”.
Para Haertel, o uso dessas ferramentas vai ajudar a tornar mais justa a escolha dos que precisam de mais atenção. “Ninguém quer ser um número num hospital, mas todo mundo é. A vocação do prontuário eletrônico é corrigir os erros assistenciais”.
Deixe o seu comentário no CNA
Fonte: Folha